O Garoto Selvagem


Por Luciana Azevedo Rodrigues

O filme garoto selvagem retoma a história de um menino encontrado em uma floresta do sul da França em 1798.

Vivendo de forma muito semelhante aos animais da floresta, este menino andava com quatro apoios, emitia grunhidos e se mostrava avesso a relações sociais. Ao ser descoberto, num contexto de afirmação do pensamento científico da aplicação do método das ciências da natureza para investigação do humano e da consolidação do sistema público de Educação Francês, o menino selvagem passa ser considerado como objeto de investigação importante com o qual se torna possível medir o grau de inteligência de alguém que foi privado de relacionamentos sociais. Nesse sentido seu estado permitiria demonstrar que tornar-se humano é algo que depende da integração social. Mas o filme não é apenas a retomada dessa história, mas sua crítica à ciência que reduz a vida a aspectos quantificáveis bem como a crítica a sociedade de sua época.

Produzido em 1969/70, o filme deste diretor que defendia o diretor como autor, em tempos de avanço do cinema americano na Europa após a Segunda Guerra Mundial, é mais uma produção que evoca sua busca de individualidade, pela construção de sua própria marca.

E para isso, o rigor com o qual seguiu os relatórios do cientista Itard não pode ser mantido a frente postura assumida pelo cientista de avaliar seu experimento como fracassado e de se negar a ver as potencialidades do menino selvagem, especialmente da relação perspectiva mimética e dominadora por ele construída com a natureza.

Assim, o filme recupera a história do menino selvagem borrando a linha que separa civilizados de selvagens. Nesta recuperação crítica da história, o presente vivido por Truffaut, de integração social que sufoca a formação da individualidade adquire expressão.

Nela, não se vê apenas um menino selvagem, mas uma ciência e sociedade que expressou sua selvageria na humilhação, ridicularização e instrumentalização do menino selvagem.

Como uma exceção, ele apenas serve para confirmar a regra. A história do diretor não permite que ele assuma a mesma postura do pesquisador Itard como um menino selvagem, ele encontrou no cinema um espaço para se formar. Nele encontrou André Bazin que reconheceu a paixão pelo cinema com os quais se mediu se expôs se indagou na luta pela autoria.


Isso inspira Truffaut a interpretar um Itard distinto também dos relatórios da sua pesquisa. Isso o inspira a construir imagens que levam a pensar na constituição do selvagem na sociedade moderna, tal como apontou Schiller, ao dizer que o Bárbaro, ou seja,é aquele que não reconhece como natureza e busca como princípio ordenador e calculador do mundo.

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