Em busca do ouro (The Golden Rush) -1925

Resenha escrita por José S. A. Melo

Não e fácil falar da obra de C. Chaplin. Não pelo motivo da maior parte de seus filmes terem sido lançados há mais de 80 anos atrás, e ter uma linguagem muito diferente daquela adotada pelo cinema atual, mas sim pelo fato dele ter feito sua arte de uma maneira simples mas de uma forma genial. Transmitir uma mensagem de maneira clara talvez seja a coisa mais díficl de se fazer na arte. E, acredito que uma obra de arte se configura com tal, somente quando seu autor consegue fazê-lo, consegue expressar o que sente, como sente, para que o outro perceba e compartilhe a sensação, para que o outro sinta também. Chaplin fez isso, pelo menos minha relação com sua obra se dá desta maneira. Não sei se todos os artistas criam assim, realmente desconfio da intecionalidade de algumas obras, mas sei que C. Chaplin queria que todos recebesse sua mensagem, queria que todos se sentissem tocados por ela. E foi assim que tranformou o cinema em algo como poesia, ele transformara o cinema em Arte. Hoje presencianos um cinema submisso a espetáculos audiovisuais. Grandes atores, bons personagens e boas atuações existem, mas nada se compara com a imagem imortalizada de Carlitos, segundo Edgar Morin, o personagem com a imagem mais forte já criada, e isso sem a "magia" da computação gráfica. O modo com que Chaplin fez cinema jamais será inigualado. As limitações das técnicas de captaçao de imagem e de som fez com que ele levasse ao extremo sua capacidade de interpretação. Vemos muito bem sua fantástica habilidade com expressão corporal no filme "Em busca do Ouro" (The gold rush). Apesar deste filme não tocar em questões sociais importantes, ou ao menos não de forma não tão explícita como o fez em outras obras ("The Kid", 1921, "Modern Times", 1936, e "The Great Dictator" 1940) esta obra é um dos maiores classícos do cinema mudo, isto se justifica pela beleza e plasticidade de suas cenas, e pela impecável atuação de Chaplin em seu personagem Carlitos. Este filme retrata um fato da história norte americana, a descorberta de ouro no estado do Alasca no final do século XIX, que causou um migração massissa de aventureiros para aquelas terras dantes inabitadas. Errando sem caminho definido Carlitos enfreta grandes perigos, um urso, a fome, a ambição dos colegas aventureiros, e lançando mão de uma criatividade sem igual dribla todos estes obstáculos. Destaque para cena em que carlitos encontra uma solução para saciar sua fome, ele cozinha seu próprio sapato. Depois de ter fracassado em sua busca pelo ouro nas montanhas frias do alasca, Carlitos vai parar em uma das pequenas cidades, provavelmente uma das cidades fundadas devido a migração de pessoas que buscavam explorar o ouro presente na região. Carlitos passa a frequentar uma espécie de Dance Hall, um local equivalente a um "Saloon" do velho oeste, só que no Alaska , e se encanta com uma das donzelas que trabalha no Local. Georgia, passa ser então o alvo da busca de Chaplin. Esqueça o ouro de título do filme, a grande busca de Carlitos passa a ser o amor de Georgia. Porém a relação entre eles é cercada por um ar de desprezo, Georgia dança com Carlitos só para se mostrar como dona de seu prório nariz, recusando-se a dançar com um típico valentão, e convidando Carlitos, numa espécie de afronta a seu antigo par. Em uma série de encontros casuais, Georgia descobre a nobreza daquele pobre homem, mas mesmo assim acabou o desiludindo não cumprindo uma promessa em visitá-lo nas vésperas do ano novo. Neste momento, cansando de esperar pela amada C. Chaplin sonha, e no sonho mostra sua graça flertando Georgia com a famosa dança dos paezinhos. Ao acordar, toma consciência da ilusão alimentada, mesmo assim Georgia, meio que impedida pelas amigas, se lembra da promessa não cumprida ao pobre mendigo. Logicamente não vou contar como se desenrola o final da trama, mas digamos que Carlitos e Georgia estavam em busca de um outra espécie de "Ouro". No meio das maiores confusões Carlitos em busca da ouro, em um contexto repleto de relações hostis, consegue achar um tempo para sonhar e amar, e quem sabe até ser feliz...


Um comentário:

  1. Texto de Saramago sobre Chaplin:




    Charlot
    Por José Saramago

    Numa destas últimas noites vi na televisão alguns filmes antigos de Chaplin, a saber, dois ou três episódios nas trincheiras da primeira guerra mundial e um filme mais extenso, “The Pilgrim”, que, retoma, com menos felicidade que noutros casos, o tema recorrente de um Chaplin sem culpas procurado pela polícia. Não sorri nem uma única vez. Surpreendido comigo mesmo, como se tivesse faltado a uma jura solene, dei-me ao trabalho de tentar recordar, tanto quanto me seria possível oitenta anos depois, que risos, que gargalhadas me terá feito soltar Charlot nos dois cinemas populares de Lisboa que frequentava quando tinha seis ou sete anos. Não recordei grande coisa. Os meus ídolos nessa época eram dois cómicos suecos, Pat e Patachon, que esses, sim, eram, para mim, autênticos campeões da gargalhada. Continuando a reflectir com os meus botões, sempre bons conselheiros porque em princípio não mudam de casa nem de opinião, cheguei à inesperada conclusão de que Chaplin, afinal, não é um cómico, mas um trágico. Repare-se como tudo é triste, como tudo é melancólico nos seus filmes. A própria máscara chaplinesca, toda ela em branco e negro, pele de gesso, sobrancelhas, bigode, olhos como pingos de alcatrão, é uma máscara que em nada destoaria ao lado das representações plásticas clássicas do actor trágico. E há mais. O sorriso de Chaplin não é um sorriso feliz, pelo contrário, aventuro-me a dizer, sabendo ao que me arrisco, que é tão inquietante que ficaria bem na boca de qualquer drácula. Se eu fosse mulher, fugiria de um homem que me sorrisse assim. Aqueles incisivos, demasiado grandes, demasiado regulares, demasiado brancos, assustam. São um esgar no enquadramento rígido dos lábios. Sei de antemão que pouquíssimos vão estar de acordo comigo. O caso é que, uma vez que foi decidido que Chaplin é um actor cómico, ninguém lhe olha para a cara. Creiam no que lhes digo. Olhem-no de frente sem ideias feitas, observem aquelas feições uma por uma, esqueçam por um momento a dança dos pezinhos, e digam-me depois o que viram. Chaplin levaria todos os seus filmes a chorar se pudesse.



    Fonte:
    http://caderno.josesaramago.org/2009/05/18/charlot/

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